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ARTROGRIPOSE MÚLTIPLA CONGÊNITA: OS PRINCIPAIS PARA ABORDAGEM FISIOTERAPÊUTICA.





Artrogripose múltipla congênita (AMC) refere-se a uma síndrome caracterizada por múltiplas contraturas articulares, de caráter estacionário, presente ao nascimento 32, 36 . Trata-se de uma afecção não evolutiva, o quadro varia de um caso para outro, e frequentemente o grau de deformidade mostra-se muito acentuado. As articulações estão comprometidas, porém não existe anquilose óssea 38 . Em contraste com a severa apresentação neonatal, o prognóstico clínico é relativamente bom 20.

O termo artrogripose deriva de duas palavras Gregas que significam “juntas encurvadas” ou “fletidas” 26 . Não é classificada como doença especifica, pois são conhecidas inúmeras patologias de base: neuropática, miopática e inflamatória que cursam com artrogripose 13, 26  .

Em 1841, Otto descreveu pela primeira vez na literatura uma síndrome caracterizada por contraturas articulares congênitas 19. Posteriormente, em 1923, Stern passou a nomear essa condição de artrogripose 48. Em 1982, Judith G. Hall e diversos colaboradores propuseram uma classificação para a síndrome baseada na distribuição do comprometimento 26 . Em 2002, Bonilla-Musoles, Machado e Osborne sugerem uma classificação mais simplificada, a qual tem sido freqüentemente utilizada na atualidade 8 . Em 2001,  Takano, Aotani e Takeuchi citam em seu trabalho uma forma assimétrica de AMC que é extremamente rara e que não se apresenta no quadro de classificação clássica 43.

Foi realizada a captação de publicações em línguas portuguesa e inglesa, relacionadas aos temas, artrogripose múltipla congênita e fisioterapia, através de bancos de dados científicos eletrônicos (Medline, Pubmed e Scielo), além de livros que citavam os assuntos específicos. Os textos coletados foram analisados e sintetizados de forma critica, a fim de discutir as informações obtidas.

INCIDÊNCIA

A incidência da AMC é de 1:3000 nascidos vivos, sendo o sexo masculino cinco vezes mais afetado 22, 36.  Em 1997, Wong relatou  uma incidência entre 1:5000 e 1:10000 nascidos vivos 48. Não existe relato de prevalência racial 12.

Na população geral, a incidência de apresentações pélvicas está em torno de 2 a 3%, já em crianças com artrogripose a incidência chega a 20%, contribuindo deste modo para uma elevada incidência de deformidades nos membros inferiores 49.

Existe uma discordância entre os autores a cerca do tipo mais freqüente de artrogripose. Bronshtein e Zimmer  referem que embora a artrogripose ocorra como um evento esporádico, há um tipo miogênico recessivo (distrofia, aplasia ou miopatia) que ocorre em mais casos 9. Segundo alguns autores,  a forma neurogênica é muito mais comum e ocorre em cerca de 90% dos casos de AMC 16, 43, 48. Enquanto, outros referem que cerca de um terço dos neonatos com AMC tem o diagnóstico final de amioplasia 4, 22.

O tempo de vida na maioria das vezes é normal. Quando existe associação com disfunção do sistema nervoso central (SNC) cerca de 50% dos pacientes morrem no primeiro ano de vida 12 .

ETIOLOGIA

Trata-se de uma afecção relativamente rara, de etiologia multifocal, tendo início na vida intra-uterina 8, 38 . A causa comum parece ser a diminuição dos movimentos fetais 19 . Existe uma ampla variação na severidade em que os músculos e articulações são afetados 8. As contraturas articulares congênitas parecem ser resposta a uma variedade de agentes e situações que criam um desequilíbrio entre forças musculares que atuam sobre as articulações. O tempo de ocorrência do fator causal, as regiões envolvidas e a natureza intermitente ou continuada do fator, determinam o grau de envolvimento 13 .

Em 1982, Judith G. Hall descreveu as seis maiores causas de artrogripose: 1) doenças neuropáticas envolvendo o cérebro, medula espinhal ou nervos periféricos; 2) miopatias primárias devido à distrofia muscular congênita, distrofia miotônica congênita e miopatia nemalínica; 3) anormalidades do tecido conectivo; 4) limitado espaço no útero como resultado de gravidez gemelar ou fibrose uterina; 5) comprometimento vascular intra-uterino; 6) doenças maternas tal como miastenia gravis 21 .

Associação de doença mitocondrial e AMC tem sido relatada recentemente. Parece ser caracterizada bioquimicamente por diminuição na atividade de um ou mais complexos da cadeia respiratória do músculo esquelético, levando ao desenvolvimento de miopatia com apresentações clínicas altamente variáveis 25, 46.

Exposição materna a drogas, hipertermia, febre materna acima de trinta e nove graus (por um período prolongado), infecções virais específicas (enterovírus, rubéola, etc), hemorragias, ameaça de aborto e pancada no abdômen materno são apontadas como fatores etiológicos 12, 13, 21, 22 .

Anormalidades estruturais uterinas; tumores pélvicos, freqüentemente em ovários; posicionamento unilateral do rim materno na cavidade pélvica, rim ectópico; podem determinar obstrução no canal de parto e mau posicionamento fetal levando ao desenvolvimento de AMC 45, 51 .A gravidez abdominal também é uma causa extraordinária de AMC, mas já foi descrita em uma gestação de dezenove semanas após tentativas de aborto terapêutico 31 .

CLASSIFICAÇÃO

A artrogripose múltipla congênita pode ser classificada de acordo com o padrão de envolvimento das articulações 22 .

Já os autores; Bonilla-Musoles, Machado e Osborne sugerem uma classificação de AMC dentro de quatro grupos básicos: 1) artrogripose generalizada, onde as quatros articulações são afetadas; 2) artrogripose distal, onde são afetados pés, mãos e face; 3) síndrome de Pterígio, em adição às contraturas há uma faixa de pele no pescoço; 4) síndrome das sinostoses, onde além das contraturas, ocorre falha na diferenciação ou separação de um membro ou parte dele, alterado a sua forma normal 8.

Masiero, Pinto e Lourenço sugerem uma classificação mais detalhada da elaborada por Judith G. Hall e cols, esta inclui: amioplasia tipos A, B e C; artrogripose distal tipos I e II; artrogripose com deficiência, por síndromes conhecidas (trismopseudocamptodactilia, Freeman-Sheldon, aracnodactilia contratural congênita, polegares aduzidos) e devido a teratogenias ambientais 21, 26. As formas amioplásicas geralmente são clinicamente mais graves. A amioplasia tipo A exibe grave comprometimento dos quatro membros, aspecto facial arredondado narinas antevertidas, filtro nasal alto e micrognatia. No tipo B nota-se grave acometimento global dos membros superiores com o tronco e os membros inferiores normais. O tipo C exibe grave comprometimento dos membros inferiores, com o tronco e os membros superiores normais. As formas distais acometem predominantemente mãos e pés sendo mais discretas as deformidades em outras articulações. Já o tipo II de artrogripose distal apresenta subtipos baseados em certas características clínicas: II a – baixa estatura, palato fendido; II b – ptose palpebral; II c – palato fendido, lábio leporino; II d – escoliose e II e – trismo.

ACHADOS CLÍNICOS

As principais características clínicas da AMC são: articulações de formato cilíndrico sem pregas cutâneas; articulações rígidas com contraturas significantes; luxação das articulações, especialmente do quadril e atrofia ou ausência de grupos musculares 41 .

Existem contraturas articulares geralmente simétricos, podendo envolver os quatro membros, com marcada escassez de tecido subcutâneo. A pele é fina e lisa, com pouca sudorese e cicatrização normal. A sensibilidade e propriocepção são normais, embora os reflexos tendíneos profundos possam estar diminuídos ou ausentes 13, 39, 41 . A severidade das lesões aumenta distalmente, tanto que mão e pés são mais severamente afetados que antebraços, braços, pernas e coxas 8.

O acometimento do membro superior pode ser total ou parcial. Existe limitação passiva e ativa das articulações 26. Os ombros geralmente são vistos em adução e rotação interna, podendo haver limitação na abdução 13, 26 .

No cotovelo podemos encontrar dois tipos de deformidades: uma em flexão, na qual a posição favorece a função; ou mais comumente em extensão, onde existe uma incapacidade funcional. O antebraço apresenta-se em posição em pronação. O punho encontra-se em flexão e desvio ulnar, deformidade mais comum e característica. Outra deformidade menos encontrada no punho é a extensão com desvio radial da mão 26 .

A mão apresenta um conjunto de deformidades complexas. Os dedos parcialmente fletidos ao nível das articulações metacarpofalângicas e interfalângicas, e o polegar incluso na palma da mão, leva a um inadequado controle muscular 13, 24. Pode haver camptodactilia, flexão permanente de uma ou mais articulações interfalangeanas, usualmente no quinto quirodáctilo ou pseudocamptodactilia 5.

No tronco, a deformidade mais comumente encontrada é a escoliose. E como costuma ser progressiva, freqüentemente traz conseqüências com obliqüidade pélvica, luxação do quadril e complicações pulmonares 26 . As maiorias das curvaturas são notadas ao nascimento ou nos primeiros anos de vida, sendo geralmente toracolombares 13, 50 . Drummond e Mackenzie relataram uma ocorrência de escolioses em 14 de 50 pacientes com artrogripose, uma incidência de 28%, onde sete desses tinham escoliose congênita associada a artrogripose.  Spender, Millar e Brown relataram, em Hong Kong, 112 pacientes com artrogripose dos quais 35 apresentavam escoliose e oito deles tinham anormalidades congênitas. Outro relato é de Bernstein, que revisou 59 registros de paciente no Tennesse e encontrou escoliose em 30%, onde duas delas eram congênitas 47 .

Já para os membros inferiores, os quadris são freqüentemente acometidos. A incidência de problemas de quadril em AMC varia de 65 a 85% e inclui contraturas, subluxação e luxação 49   . As contraturas em flexão pura são as mais comuns. São também comuns as contraturas em flexão associada com abdução e rotação externa. A luxação do quadril é um achado freqüente, sendo devido a vícios posturais intra-uterinos. Ainda podem ser encontradas as seguintes alterações: coxa valga, acetábulo pequeno e raso, cabeça femoral fusiforme e aumento do ângulo de anteversão femoral 26 . O joelho pode apresentar-se fletido ou hiperextendido e, nesta última situação, pode haver luxação posterior da tíbia 26. Na maioria dos casos, os joelhos apresentam-se em flexão, com marcada diminuição da força do músculo quadríceps 13. Os pés podem apresentar as mais variadas deformidades: eqüinovaro, talo vertical, plano valgo e cavo-varo 5, 33. A principal característica do pé artrogripótico é a marcada rigidez de suas articulações. A gravidade reside nas importantes alterações da anatomia dos ossos, verificada já nos primeiros meses de vida, sendo o principal motivo dos maus resultados diante do tratamento conservador 26.

Um grande número de anormalidades congênitas envolvendo muitos órgãos e sistemas podem ser associados com artrogripose, como exemplo tem-se, hipoplasia pulmonar, fístulas traqueo-esofágicas, fenda palatina, anormalidades oftalmológicas, hérnias inguinais ou umbilicais 10, 18, 28. Problemas cardíacos incluem defeitos congênitos e cardiomiopatia. Os rins, útero e bexiga podem mostrar anormalidades estruturais. O diafragma também pode estar comprometido, geralmente afetando a função pulmonar 12. Pode ser encontrado ainda hemangioma capilar frontal que desaparece com a idade, hipoplasia dos dedos e genitais 12, 14, 18, 26 .

Deformidades faciais incluem assimetria, ponte nasal plana e alterações mandibulares, micrognatia e trismo 12. Dificuldades alimentares, problemas de linguagem e crescimento insuficiente são comuns 1 .

Neonatos com artrogripose distal podem ter fenda palatina, fenda labial, língua pequena, trismo, ptose e prega epicântica suave. Neonatos com amioplasia podem exibir rosto arredondado, nariz curto arrebitado, micrognatia, dedos delgados e hemangioma capilar frontal 4 .

DIAGNÓSTICO

À medida que se tem incorporado novas técnicas de diagnóstico tanto pré como pós-natais, a prevalência de defeitos congênitos ao nascimento tem aumentado 29 .

O diagnóstico de AMC pode ser feito no período pré-natal por meio de ultra-sonografia, radiologia e fetoscopia. Geralmente é feito por volta do segundo trimestre gestacional 22, 27. Visto que a condição não é prejudicial para a mãe ou letal para o feto e possui alternativas de tratamento, a gravidez pode seguir um curso normal 42. O diagnóstico baseia-se na combinação de acinesia fetal, posição anormal dos membros, retardo no crescimento intra-uterino e polidrâmnio 3. Embora exista relato ecográfico de AMC diagnosticada no primeiro trimestre gestacional, o diagnóstico pré-natal é difícil, existindo poucos relatos na literatura 2 .

Em 1998, Alencar et. Al., em relato de caso, observaram por meio de ultra-sonografia morfológica uma gestação de trinta e duas semanas (terceiro trimestre), com polidrâmnio, ausência de movimentação fetal, inclusive movimentos respiratórios 3. O concepto apresentava acentuado retardo de crescimento intra-uterino, com extrema diminuição da circunferência abdominal e torácica, implantação baixa dos pavilhões auriculares, micrognatia, flexão contínua dos membros inferiores e superiores, rotação interna dos fêmures e pé torto à direita. Em ultra-sonografias seriadas as alterações evidenciadas foram confirmadas e registrou-se piora contínua das lesões descritas, ficando estabelecido o diagnóstico de artrogripose ainda no período pré-natal. Ultra-sonografia pode ainda ser utilizada para avaliar o envolvimento do sistema nervoso central (SNC) e possíveis anormalidades das vísceras 12 .

O uso de ressonância magnética tem sido relatado para AMC e outras disfunções musculares 12, 40 . É uma técnica não invasiva que permite identificação e quantificação de alterações em músculos isolados 17. Fedrizzi et al. e Philpot et al. sugerem que ressonância magnética pode ser usada em crianças apresentando artrogripose, pois conhecendo o padrão de envolvimento muscular nesses pacientes podem ser fornecidas informações sobre o processo patológico de base e/ou ajudar na procura por genes e proteínas responsáveis pelas alterações 16, 34 .

Tomografia computadorizada é útil para avaliar o comprometimento tanto do SNC quanto da massa muscular 12 .

Biópsia muscular pode exibir evidência de miopatia e neuropatia 23, 38. Biópsia de pele pode ser feita para cultura de fibroblastos sendo usada para análise cromossômica. Eletromiografia (EMG), em área normal e afetada, mostra-se útil na diferenciação de causas neurogênicas e miogênicas. Teste de condução nervosa avalia a velocidade de condução em nervos motores e sensitivos, sendo geralmente realizados quando uma neuropatia periférica é suspeitada 12. Estudos cromossômicos são indicados no grupo de pacientes com envolvimento cerebral 4.

No exame histoquímico a característica mais notável é uma distribuição anormal nos tipos de fibras musculares 44. Em geral, exames laboratoriais como: níveis de creatina fosfoquinase (CPK), cultura viral, níveis de imunoglobulina M, estudo citogenético, não são específicos. Podem ser solicitados para confirmar determinadas hipóteses diagnósticas 12.

Diagnóstico diferencial deve ser feito com paralisia do plexo braquial bilateral. A diferenciação é feita porque a postura anormal da AMC é tanto ao repouso quanto ao movimento, enquanto que a postura anormal na paralisia do plexo braquial bilateral é apenas durante o movimento 4, 37. Anquilose óssea pode ser confundida com artrogripose, mas inclui fusão de falanges, fusão de ossos do carpo e tarso, e também sinostose 12.

DESENVOLVIMENTO MOTOR

Crianças com ACM podem apresentar atraso no desenvolvimento motor em várias etapas. Por exemplo, o rolar é freqüentemente difícil em função das contraturas dos membros inferiores. Algumas crianças podem aprender a se arrastar no chão, por cima de seus ventres, ou de costas, inicialmente. A maioria das crianças pode sentar, mas têm dificuldade em alcançar a posição sentada independentemente. Engatinhar com as mãos e com os joelhos em geral é difícil, e as crianças muitas vezes aprendem a se movimentar com suas nádegas. O ato de puxar-se para ficar em pé pode ser limitado pelas contraturas das extremidades inferiores. As atividades de pré-deambulação de vem ser iniciadas antes de um ano de idade. Entre a idade de doze meses até a pré-escola o objetivo do tratamento é desenvolver o máximo de independência com mobilidade e habilidades de auto cuidados. A deambulação é possível para muitas crianças com AMC e deve ser considerado um objetivo viável até que se prove o contrário.

As habilidades dos membros superiores concentram-se nas atividades de alimentação e de vestimenta. O período de idade escolar com freqüência evidencia as incapacidades funcionais que possam existir na criança com AMC. Sua velocidade de deambulação pode ser lenta quando comparada com a de seus colegas, e as dificuldades motoras finas podem interferir na velocidade e na exatidão da escrita 41.

Em 2001, Burke descreve o desenvolvimento motor de uma criança com Artrogripose 11. Ela iniciou deambulação dentro do tempo de desenvolvimento normal embora sua percepção de equilíbrio estivesse um pouco alterada. A criança não tinha reflexos de proteção, mas aprendeu a equilibrar-se rapidamente podendo correr, pular e pedalar bicicleta do mesmo modo que as crianças de sua idade. Aos dois anos era capaz de puxar-se, alimentar-se, virar páginas de revistas e carregar objetos com uma preensão razoavelmente boa. Nesta mesma idade ela estava aprendendo a vestir-se independentemente. Aos quatro anos conseguiu estabelecer completa rotação voluntária em ambos os ombros. Aos cinco anos ela era auto-suficiente, e apesar de exibir uma pequena fraqueza em seus braços, podia fazer tudo o que uma criança da mesma idade fazia.

TRATAMENTO

O tratamento da AMC pode ser conservador ou cirúrgico, realizado por uma equipe multidisciplinar composta por: médico pediatra, cirurgião, fisioterapeuta, terapeuta ocupacional, assistente social e psicólogo 20, 38, 48  . Os principais objetivos do tratamento intensivo multidisciplinar são: 1)manutenção da amplitude de movimento articular, 2)fortalecimento da musculatura residual e melhora da hipotonia, 3)facilitação da aquisição das etapas do desenvolvimento motor e cognitivo, 4)melhor integração do esquema corporal, como forma de facilitar a aquisição de padrões de movimento necessários à realização das atividades da vida diária e prática 26.

A variedade de quadros clínicos e graus de acometimento exigem que o tratamento do portador de artrogripose seja feito de forma individualizada 26. O tratamento precoce, no período neonatal, deve ser feito de forma não cirúrgica, podendo ser requerido tratamento cirúrgico após esse período 4. Pode ser esperada uma melhora lenta, sem que ocorra perfeita restauração da função 36. Deformidade recorrente é comum, particularmente em pacientes com ossos imaturos 6. Com bom direcionamento do tratamento o prognóstico pode ser excelente, com sobrevivência até a fase adulta 19.

Tratamento Ortopédico-Cirúrgico

Masiero, Pinto e Lourenço sugerem utilização de órteses e/ou aparelhos gessados seriados para os membros superiores 26. Quando se obtém a correção das deformidades, mantém-se órteses por períodos prolongados para diminuir a recidiva. Se esse tratamento é ineficaz, ou ocorre recidiva, a cirurgia é indicada. Osteotomia derrotativa do úmero, capsulotomia posterior do cotovelo, alongamento do tendão do tríceps, transferências musculares, carpectomia e artrodese radiocárpica são algumas das cirurgias mais comuns. Dias e Gabrieli citam que se a musculatura do ombro for muito pobre, uma artrodese dessa articulação pode estar indicada 13. Autores referem em seus trabalhos a cirurgia de transposição do músculo grande dorsal como forma de restaurar a flexão de cotovelo 15, 18. Enquanto, outros citam que vários procedimentos cirúrgicos vêm sendo utilizados para reduzir contraturas em flexão do punho, com melhores resultados sendo conseguidos por combinação entre procedimentos ósseos (osteotomia ou carpectomia) e de partes moles (transferência tendínea) 7, 39.

De acordo com alguns trabalhos,  para correção da escoliose coletes bivalvados e de Milwauke podem ser utilizados como modo de controlar a evolução da curvatura em crianças menores, reservando o procedimento da artrodese vertebral para casos restritos 13, 26.  Em 1994, Winter cita que essas curvaturas não são fáceis de tratar e o tratamento com órtese parece ser satisfatório apenas para curvas relativamente flexíveis, menores ou iguais que 50 graus, particularmente em crianças em desenvolvimento 47. Yingsakmongkol e Kumar mostraram em seus estudos a ineficácia das órteses no tratamento de escoliose quando a curvatura era maior que trinta graus 50.

Há trabalhos que citam os procedimentos mais comuns para correção de deformidades dos membros inferiores: liberação de partes moles, capsulotomias, tenotomias, osteotomias, uso de gesso pelvipodálico, cruropodálico, etc 13, 26. A luxação unilateral do quadril deve ser tratada evitando possível desenvolvimento de obliqüidade pélvica e escoliose compensatória. Sugere-se redução aberta, acompanhada de liberação de partes moles, varização e derrotação femoral proximal se a criança tiver mais de dois anos de idade. Em 2002, Yau et al. em seu follow-up mostrou que utiliza redução aberta para a correção de luxação de quadril e que esta cirurgia pode ser complementada com o redimensionamento acetabular, melhorando o acoplamento articular, aumentando a estabilidade e diminuindo o número de recidivas 49. As contraturas residuais dos joelhos e pés são corrigidas cirurgicamente entre os seis e doze meses de idade 41. Segundo Nicomedez et al., artrodese entre tíbia e calcâneo pode ser realizada após talectomia como forma de reduzir dor e aumentar a estabilidade do pé, aumentando seu padrão funcional 30.

Tratamento Fisioterapêutico

Foi sugerido que um programa de fisioterapia intensiva, com exercícios passivos e ativo-assistidos, realizado de forma constante, várias vezes ao dia, seja instituído ainda no período neonatal, contando com a participação ativa dos pais da criança previamente orientados 13, 26. Em 1998, Shepherd refere que as técnicas de mobilização e alongamento devem ser aplicadas várias vezes ao dia, durante períodos de breve duração 38.

Os principais objetivos da fisioterapia são: marcha e independência nas atividades da vida diária, alcançando o nível máximo de função para cada criança 26, 41. Isto pode ser conseguido através da correção e manutenção da posição dos membros, preservação do alinhamento articular, estímulo à aquisição das etapas do desenvolvimento motor normal, atividades de fortalecimento, uso de órteses, de gessos e etc, tendo como objetivo final o máximo de independência possível 35, 41.

Inicialmente o fisioterapeuta executa alongamentos passivos e mobilizações suaves das articulações comprometidas. Deve-se tomar precaução para alongar apenas até o final da amplitude, mantendo o alongamento com um gesso ou uma órtese. Alongamento agressivo resultará em dano à cápsula e aos tecidos moles periarticulares. Posteriormente incentiva-se os movimentos ativos de membros e tronco. O fisioterapeuta trabalha para contribuir na construção de um tronco estável, que é a chave para deambulação independente 35, 41.

Decúbito ventral deve ser promovido o mais precocemente possível, com a finalidade tanto de alongar as estruturas da porção anterior dos quadris, como de manter a extensão desta articulação após cirurgia de correção da deformidade em flexão 36.

Durante o período de lactância até os doze meses de vida o terapeuta deve estimular a criança a adquirir etapas do desenvolvimento motor normal como o rolar, posição prona com antebraços apoiados, o sentar, o engatinhar, e por fim o andar. A partir da posição sentada, a mobilidade no chão deve ser encorajada 35, 41.

É preferível incentivar a criança a conseguir deambular sem apoios, mas se for estritamente necessário, pode-se introduzir suportes como: andador, muletas com apoio de antebraço, tutor longo, etc 35.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

AMC é uma afecção que pode ser detectada logo no período pré-natal. Sua etiologia permanece incerta, havendo várias hipóteses para seu desenvolvimento. Quanto mais precocemente a AMC for diagnosticada, maiores serão as chances de sucesso com o tratamento conservador, ficando o tratamento cirúrgico reservado para os casos mais severos.

O sucesso do tratamento depende da forma de apresentação do quadro e do início dos exercícios. À Fisioterapia cabe corrigir as deformidades através dos métodos físicos, muitas vezes em combinação com a correção cirúrgica, e em incentivar e treinar a habilidade da criança na execução de hábitos cotidianos.

Todas as formas de tratamento devem visar não apenas a melhora funcional, mas também os benefícios emocionais como o aumento da auto-estima e a socialização da criança, parte importante para seu desenvolvimento global.

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